Pacientes que têm órgãos transplantados precisam tomar medicação por toda a vida, para evitar que o corpo rejeite o implante. Mas esse não é o caso de Samantha Noventa, 32 anos, que faz parte de um grupo de cerca de 10 pacientes de todo o país que passaram por um procedimento incomum e altamente complexo: o chamado transplante auxiliar de fígado. Neste procedimento, a equipe cirúrgica preserva uma parte do fígado do paciente e realiza o implante de um novo órgão inteiro, como explica o cirurgião hepatobiliar Eduardo Fernandes, coordenador do serviço de transplantes hepáticos do Hospital São Francisco na Providência de Deus (HSF-RJ), o maior centro transplantador renal e hepático do estado do Rio de Janeiro.
“No caso de Samantha, usamos uma técnica para a remoção de 75% do fígado nativo dela e implantamos um órgão inteiro. Na prática, ela ficou com 2 fígados, ou seja, uma parte do fígado próprio que foi preservado e o outro, que foi doado. Com isso, após alguns meses nós poderemos remover o fígado que foi transplantado nela e o nativo recuperar a falência a que foi acometido. Assim, ela não precisará tomar remédio pelo resto da vida para evitar a rejeição ao órgão”. Samantha é apenas a quarta paciente a passar por esta modalidade de transplante no HSF. Ao todo, já foram realizados na unidade 943 transplantes hepáticos, de 2013, quando este serviço teve início, até o fim de setembro deste ano.
Vida nova
Um mês e meio depois da cirurgia, o sentimento de Samantha é de gratidão. “Eu demorei a entender o que tinha acontecido e só tive noção da gravidade da situação aos poucos”, lembra ela. Samantha teve uma hepatite fulminante que evoluiu rapidamente e, quando chegou ao HSF transferida de outra unidade, estava em estado grave. “Eu não tenho lembrança do que aconteceu logo depois que cheguei ao Hospital São Francisco”, conta ela. Mariana Noventa, irmã de Samantha, que esteve ao seu lado na primeira unidade de saúde em que esteve internada, relata que Samantha teve um edema cerebral. “O médico avisou que precisaria intubá-la e que ela tinha no máximo 48h para que o transplante fosse realizado”, recorda. Mariana diz que a família ficava de plantão no hospital, mesmo fora do período de visitas, porque era o jeito de poder ficar mais perto de Samantha. “Eu agradeci por ela ter sido transferida para o HSF, porque sentia que ela estava no lugar certo. O sentimento era confuso: nós sabíamos que não poderíamos nos desesperar e devíamos manter o otimismo, mas era difícil torcer para ela ter um órgão pois isso significaria que alguém teria que perder a vida”, relata.
Dois dias depois, exatamente no dia 17 de agosto, um dia antes do aniversário de Mariana, o novo órgão chegou e, só depois do procedimento e ainda em recuperação é que Samantha ficou por dentro de tudo o que tinha passado. “Acordei seis dias depois da cirurgia com boas notícias: nós batemos o recorde de doação de sangue, com mais de 100 doações em meu nome. Estou esperançosa e feliz por ter essa segunda chance e por ter tanta gente que apoiou minha família neste momento difícil e o desafio agora é encarar o futuro: vou lutar para ter de volta minha autonomia, vou cuidar melhor do meu fígado e adotar hábitos mais saudáveis”, prevê ela.